quarta-feira, 30 de março de 2011

terça-feira, 22 de março de 2011

Expectadores do sono



Deitada à meia luz os pensamentos vagueiam.
Em um canto do quarto eu vejo a Caixa.  Seus contornos dourados cintilam na bruna da noite escura. No relógio: 3hrs da manhã.  Horinha interessante. Minha paixão por histórias e mitos antigos sobre o bem e o mal provocam um arrepio de memória que corre pelo meu corpo todo. Sinto o frio que conforta e que amedronta ao mesmo tempo. 
Hoje não, eu penso. Prefiro fitá-la de longe.

A insônia, minha perigosa companheira é a mesma que castiga o corpo e instiga a mente. Idéias, opiniões, factos e planos afloram sem controle.  Tentando convencer a mim mesma que está tudo bem, pergunto-me: o sono não estaria mesmo superestimado? Às vezes é preciso parar e escutar as vozes intrínsecas que gritam dentro de nós e que se perdem no caos de nosso dia a dia.
O pensamento flutuante vagueia além de meus próprios horizontes. Tento retornar aos sonhos cerrando os olhos em total silêncio. O falso negro das pálpebras não engana e as cores retornam como que doces gotinhas de alívio.
É tão errado esperar mais da vida e das pessoas?  Minha fé, demasiada otimista, concorda comigo sobre meu ombro direito, afirmando que todos são dignos de chances de serem melhores. Enquanto do meu lado esquerdo pesa a memória, que me puxa de volta dizendo: você lembra do passado, das dores e chances desperdiçadas?
A cada dia fica mais claro que a mente sem exercício se vicia. Vira receptáculo insípido de idéias fajutas. Próprias ou não.  E, ao mesmo tempo se vê como é simples se tornar coadjuvante da própria vida.
Quem nunca pensou alguma vez: Talvez eu não pertença a esse lugar?
Talvez eu pense demais e durma de menos... Mas como é difícil achar alguém para ter uma conversa inteligente, sem segundas nem terceiras intenções!  Alguém com gosto musical, com opiniões próprias e que saiba beber uma boa cerveja gelada.
Acho que ficou claro que isso é um manifesto. Ou melhor:  É um repúdio a ignorância cultural.
 Existe toda uma geração que cresce e que se acostuma a ver o mundo influenciada pelos olhos da mídia. Personalidade e opinião própria tão flutuantes quanto o toque que troca de um canal pra outro. Todos muito ocupados. Ocupados vendo novela, ocupados copiando modismos, vivendo a vida de outrem, ocupados fantasiando a vida e esquecendo de vivê-la, ocupados dormindo...
O homem é um eterno observador dos outros, eu sei... mas está mais do que na hora de renovar o repertório. Está na hora do homem fazer a si próprio.
 Durante um show cultural, há alguns dias atrás na cidade, fiquei por um tempo fitando o olhar das pessoas. Deu pra sentir no ar o brilho daqueles olhos. A ânsia por cultura, por diversidade, por momentos mágicos de crescimento, que façam com que os dias e noites se tornem mais leves e os corpos e mentes salutares. Quisera que tivéssemos mais momentos desses por aqui.
Sim, ansiamos por um teatro municipal, por um cinema mais novo e moderno, uma biblioteca pública mais completa, um museu de arte que não fale apenas da já esgotada saga da imigração. Shows e movimentos culturais de nível, estímulos que nos façam mais do que já somos.
Por que no final de tudo, a fé nas pessoas permanece sempre e a esperança... é o sonho do homem acordado.

Viro-me na cama me cobrindo por completo. A madrugada fria começa a ceder e minha mente também.  Um bocejo me faz fechar os olhos pesadamente. Num último relance vislumbro a Caixa, que agora está  entreaberta.
 Antes de mergulhar no sono profundo eu penso: sua danadinha...