Would you lie with me and just forget the world?”
Pense Pandora, pense!
Procuro mentalmente onde coloquei as chaves da pequena Caixa. Tenho que abri-la! É hora de escrever, confessar meus pecados e ouvir meus próprios conselhos. Não sei se isso é uma oração ou um poema, talvez a mesma coisa, pois como diria o poeta “orações e poemas são palavras que pronunciamos a partir do silêncio, pedindo que o silêncio nos fale”.
Repasso meu mouse pelas páginas da nova novela da vida chamada facebook. O tal querido diário mundial, que tanto é moçinho, quanto é vilão. Por ali me deparo com aventuras, alegrias e tragédias do cotidiano humano. Estamos cada vez mais ligados aos tormentos alheios não é? Página a página sinto como se o mundo inteiro caminhasse sobre as minhas costas. E fora isso, ainda conflitamos com nossos sentimentos, as dores próprias e lutas diárias que temos que carregar. O que ninguém pergunta ou quer saber é o que acontece com a gente quando nos deparamos com a dor que não é nossa? Eu me transformo em outro? Com essa proximidade entre pessoas e sentimentos acabamos por cultivar em nós mesmos o acúmulo de muitos mundos. Thank’s very much Mark Zuckerberg!
É a vida que passa. E que muda. E muda a gente.
O dia a dia ás vezes suga a gente. A rotina com suas garras e artimanhas tenta nos arrastar pro marasmo do cômodo. Por vezes o cansaço me faz querer parar. Sensação de que já vivi mais do que meu coração suporta. Chego à conclusão de que realmente pra gente ser feliz é preciso ser um pouco louco. Louco para aceitar as mudanças. Louco para reinventar histórias, aceitar a vida de verdade com seus ciclos, suas ondas, suas oscilações…
Mas e se a gente perder a gente mesmo ao se olhar no espelho? Coloco meus óculos e torno a me olhar. Ali vejo todo movimento interno e secreto da mudança. Algo emerge do fundo de mim, de um lugar onde nem eu mesma, nem a Caixa podemos tocar. Vejo um novo eu. Com outras opiniões, outras máscaras, outros silêncios. A maturidade e as responsbilidades formaram um novo reflexo.
Eu, experimento inacabado.
Eu, rascunho. Que aprende todos os dias. Que ensina ou tenta ensinar. Uma mistura de pequenos encontros. A vida me afeta com seu poder de vivência. Empurra-me para reações inusitadas, repletas de sentidos ocultos. Muitos encontros; muitos desencontros. As chegadas e partidas se misturam e confundem o coração. É nesta hora em que me pego nutrindo sonhos de cotidianos estreitos, previsíveis.
Eu, que preciso continuar.
Com essas pequenas pausas repositórias que a Caixa me proporciona, eu continuo na vida. A trama da minha criatividade depende disso, deste inacabado que há em mim. Eu sou assim. Sem culpas.
Volto meu olhar novamente para o espelho, e num feixe de luz vejo o reflexo da chave da minha Caixa, que jaz, pêndula e brilhante no cordão sobre meu peito.
Fecho os olhos e faço a última oração da noite:
"Que Deus me proteja de gente má, cruel, invejosa. Mas, principalmente, de gente sem graça, sem sal, sem veneno, sem beleza e sem loucura." (Tati Bernardi)